Contratação temporária para Guarda Municipal do Rio desafia Constituição e pode criar milícia paralela

Foto: Robert Gomes

A proposta analisada neste artigo encontra-se no Projeto de Lei Complementar nº 13, de 2025, que trata da criação da chamada Força de Segurança Municipal do Rio de Janeiro – FSM-RIO e da Força de Segurança Armada – FSA, prevendo, ainda, a contratação temporária de parte de seus integrantes.

Veja esse PLC no sítio abaixo:

Temporário, Constitucionalmente Inaceitável

A proposta de contratação temporária por até seis anos para integrantes da Guarda Municipal representa uma afronta à Constituição Federal, à lógica administrativa e ao direito da população a uma segurança estável e profissional.

A Constituição, no artigo 37, inciso II, estabelece que o ingresso em cargos públicos deve ocorrer via concurso. A exceção, prevista no inciso IX, é restrita a casos de necessidade temporária de excepcional interesse público, o que não se aplica à segurança pública.

A proposta prevê que agentes temporários terão acesso a dados sensíveis da administração e, ao fim do contrato, serão lançados ao mercado privado — inclusive aquele composto por empresas de segurança e grupos paramilitares.

Criar uma tropa armada e temporária, sem concurso público, é institucionalmente temerário e socialmente irresponsável, alerta o texto.

O histórico do “Capitão Adriano”, ex-Bope e miliciano retratado no livro Decaído, de Sérgio Ramalho, é lembrado como um alerta sobre os riscos de infiltração até mesmo em corporações rigorosamente treinadas.

O STF Já Disse: É Inconstitucional

O Supremo Tribunal Federal, na ADI 3222, declarou inconstitucional a criação de policiais militares temporários no Rio Grande do Sul, por violar a competência da União e os princípios do concurso público e da isonomia.

“Privilegiar soluções provisórias para problemas permanentes desatende o comando constitucional”, afirmou a ministra Cármen Lúcia.

A decisão transitou em julgado em 12 de fevereiro de 2021. Portanto, não cabe mais recurso. E como o STF já reconheceu que as Guardas Municipais integram o sistema de segurança pública, a mesma lógica se aplica: não se pode admitir contratação sem concurso.

Resumo da Decisão – ADI 3222 / RS

  • Julgamento: Unânime
  • Trânsito em julgado: 12/02/2021
  • Relatoria: Ministra Cármen Lúcia
  • Violação ao artigo 37, II, da Constituição
  • Ausência de excepcionalidade
  • Remuneração inferior e vínculo precário

A íntegra da decisão pode ser acessada aqui:

Interferência Política, Apadrinhamento e o Caso dos Fantasmas

Casos de nomeações irregulares já foram registrados na Prefeitura do Rio, como a denúncia de “funcionários fantasmas” feita pela TV Globo em agosto de 2022. Nomeados com altos salários pagos pelo Gabinete do Prefeito, esses servidores trabalhavam em Nilópolis, fora da sede do Município.

Criar uma força armada sem concurso, com acesso a dados estratégicos, é abrir espaço para uma tropa paralela a serviço de interesses políticos, destaca o texto.

A proposta já foi apelidada de “milícia do Eduardo Paes” por críticos.

Processo Seletivo Não É Concurso Público

Ainda que o processo seletivo proposto no PLC 13/2025 inclua testes e curso de formação, ele não substitui o concurso público exigido pela Constituição.

“Aplicar o modelo proposto fere frontalmente a Constituição e a jurisprudência do STF. Trata-se de uma tentativa de burlar o sistema de mérito e estabilidade”, afirma o autor.

O prefeito Eduardo Paes já demonstrou preferência por contratos temporários, segundo o texto. Na proposta original do projeto, ele pretendia criar um novo órgão com outra denominação para escapar das exigências do Estatuto das Guardas Municipais (Lei nº 13.022/2014).

Segundo o artigo 15 dessa lei, cargos em comissão devem ser ocupados por servidores de carreira. A exceção de nomeação externa nos quatro primeiros anos não se aplica ao Município do Rio.

Criar um novo nome para a Guarda é uma tentativa de atalho jurídico para montar uma estrutura armada subordinada politicamente, alerta o texto.

Nem o Novo Nome Pode

A mudança de nome da Guarda Municipal para “Força de Segurança Municipal” também é considerada inconstitucional, pois fere o artigo 144, §8º, da Constituição, e a própria Lei 13.022/2014, que reconhece apenas Guardas Municipais.

Esse ponto foi abordado anteriormente no artigo “A ‘Milícia Municipal’ de Eduardo Paes e o Risco de Inconstitucionalidade”, publicado no Diário do Rio:

Enterrem a Contratação Temporária para a Milícia do Eduardo Paes, Defendam a Constituição

O concurso público é um pilar do Estado Democrático de Direito. Ele garante igualdade, mérito, legalidade, estabilidade e impessoalidade no serviço público. E deve ser a única porta de entrada para cargos na segurança pública.

Caso aprovado pela Câmara, o PLC 13/2025 será derrubado pela Justiça. Sem dúvida alguma.

A Câmara já demonstrou resistência institucional ao barrar tentativas anteriores do Executivo, como exposto no artigo:

“Câmara do Rio impõe primeira derrota à ‘milícia’ de Paes e reafirma sua autonomia legislativa”

A proposta de contratar temporários armados sem concurso é inconstitucional, perigosa e contrária ao interesse público. A segurança pública deve ser exercida por uma guarda de Estado — concursada, estável e comprometida com a legalidade — e não por uma guarda de governo, moldada a interesses eleitorais.

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